Tempo passa, as coisas mudam, mas as lembranças continuam.
Vivemos de memórias. Não podemos viver do passado, mas o que seria de nós se não tivéssemos lembranças? Fico imaginando como seria uma pessoa sem lembranças, sem memória. Deve ser terrível. Em várias reportagens de catástrofes, quando as pessoas perdem suas casas em terremotos, tsunamis, incêndios, etc, os objetos que mais sentem trem perdido são as fotografias. Por que? Porque elas são lembranças do que as pessoas viveram.
O que vivemos forma o que somos hoje, as lembranças são a nossa história. Algumas são doces, outras mais amargas e umas podem ser até indiferentes, mas são nossas, nos pertencem. É impressionante ver como cada momento vivido fica guardado de maneira diferente em cada pessoa.
Ontem, minha irmã e eu fomos ao centro da cidade procurar uma loja. Acabamos andando um trecho da Avenida Afonso Pena a pé. Moramos muitos anos no centro, até os meus 14 anos de idade. Andava a pé tranquilamente, naquela época isso era possível. Ontem, enquanto andávamos vimos como a Igreja São José ficou linda depois da restauração. Está no estilo marroquino ou russo, sei lá, só sei que ficou linda.
Íamos andando e lembrando das lojas Guanabara, Inglesa Levy, Bemoreira Ducal, Sloper. Eram lojas ótimas que íamos sozinhas na maior tranquilidade. A Kopenhagen que ficava na esquina de Tamoios e Afonso Pena. Saudade. Enquanto conversávamos sentia o cheiro de urina, que nem a chuva que tinha caído foi suficiente para limpar. Olhava em volta e via o cenário que nem de longe lembra o antigo. Nesta época a Avenida já estria toda enfeitada com motivos natalinos, hoje, nem sombra de luzinha, nem mesmo nas lojas.
Morava na Rua Tupis em frente do Shopping Cidade, na época era o Cine Jacques. E ali no centro tinha também o Cine Guarani, onde hoje é o Museu Inimá de Paula, o Cine Tamoio e o Metrópole, onde hoje é o Bradesco. Nas férias eu nadava de braçada. Como não era perigoso ir sozinha no cinema, entrava na seção das 14h e saía às 18h. Tinha uns 11 anos. O único problema eram os tarados, então tínhamos que assentar na cadeira da beirada, no corredor do meio. Se algum homem assentasse do lado, era só mudar de lugar. A gente sempre usava um broche, qualquer coisa fincava a mão do tarado. Quando íamos em turma, lanchávamos depois no Saci.
Lembro quando passou E o vento levou. Foi no Cine Pathé, na Savassi. Eu tinha 13 anos e as primas todas resolveram ir. Ângela Rocha, minha prima não quis me deixar para trás, mas eu não tinha idade. Ela soltou meu cabelo, me maquiou e lá fomos nós. Entrei, 4h de filme. Dormi mais da metade, mas estava me achando porque entrei em um filme de censura 16 anos.
Tia Neury morava no Edifício Niemeyer. Não esqueço uma vez que estávamos todos lá, já era bem tarde. Eu estava brincando com as Barbies da Beth – eram lindas, tinha trazido da Europa, aqui não existia –, aí me chamaram na sala e quando cheguei tinha uma vela sobre uma latinha de extrato de tomate e toda a família cantava parabéns para mim (no dia seguinte era meu aniversário). Foi a primeira surpresa que fizeram para mim. Fiquei tão emocionada. Eu era uma pré-adolescente. Chorei muito. Até hoje lembro a emoção que senti: a pessoa mais amada e importante do mundo.
Lembranças, memórias. Como é bom.
Isabela Teixeira da Costa