Aos que são queridos
Vinicius de Moraes escreveu um lindo poema sobre os amigos. Atrevo-se a transcrever alguns de seus versos: “E eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!
(…) A alguns deles não procuro, basta-me saber que eles existem. Esta mera condição me encoraja a seguir em frente pela vida (…) Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro, embora não declare e não os procure. (…) Se alguma coisa me consome e me envelhece, é que a roda furiosa da vida não me permite ter sempre ao meu lado todos os meus amigos, e, principalmente, os que só desconfiam – ou talvez nunca vão saber – que são meus amigos!”.
Como me vejo nesse poema! Quantas pessoas tenho como amigos, mas sem tempo de declarar-lhes isso, de encontra-las e conviver com elas…
Tinha um tio, Ney Blázzio, que morreu cedo, de acidente de carro, com a mulher. Eram muito queridos. Alguns anos depois, alguém da família me disse que ele teria revelado uma tristeza: nunca foi convidado por nenhum sobrinho para almoçar ou jantar em sua casa. Aquilo cortou meu coração.
Ele era amado por todos, morava em Brasília e sempre nos recebeu durante as férias. Aguentava aquela meninada o mês inteiro, com amor e paciência. Sempre vinha a Belo Horizonte, nós nos encontrávamos na casa de minha mãe e de outros tios, mas nunca o convidei para jantar ou mesmo para um lanche. A gente, quando é jovem, nem pensa que gestos assim podem agradar tanto a uma pessoa querida.
Sou evangélica, cresci ns Igreja Batista Central, onde fiz amizades sólidas. Saí por alguns anos. Quando retornei, encontrei-me com uma senhora de quem gosto muito. Ela me abraçou e começou a chorar de emoção ao me rever. Aquilo me tocou profundamente. Na mesma hora, lembrei-me daquele comentário que ouvi décadas atrás sobre meu tio. Decidi fazer um lanche na minha casa e convidar algumas amigas da adolescência – entre elas, duas senhoras da igreja, de quem eu gosto tanto, as irmãs Ana Maria, leitora assídua desta coluna e Lucília Mazoni.
Foi das melhores coisas que fiz nos últimos tempos. Nossos olhos brilhavam, ficamos ali horas conversando, relembrando nossa juventude, contando casos, rindo e nos emocionando. Percebemos o quanto os ensinamentos foram importantes para nossa formação. Só demos conta de que já era tarde da noite quando o marido de uma delas ligou para saber onde a mulher estava até aquela hora. Nos despedimos já com o próximo encontro marcado.
Deus é maravilhoso e nos dá a oportunidade de fazer do nosso tempo um dia perfeito, produtivo. Creio que ele não permita que saibamos o futuro para que tenhamos a oportunidade de escolher como ocupar o nosso tempo. Cada dia de nossa vida é uma página em branco: depois de vivida, não muda mais. Cabe a nós preenchê-la da melhor maneira possível.
Três coisas que não voltam atrás: a pedra atirada, a palavra dita e o tempo passado. Devemos pensar muito antes de agir. Cabe-nos saber aproveitar o tempo. A única certeza que temos é de que vamos morrer, cada um de nós tem a sua senha, ninguém sabe quem será chamado primeiro. Devemos viver com quem amamos e nos ama, vamos aproveitar nossos dias e escrever um lindo 2016. Quando alguém partir, teremos a certeza que não ficamos devendo a essa pessoa querida nenhuma demonstração de amor. (Isabela Teixeira da Costa/Interina)
Crônica publicada no Caderno EM Cultura, 30/1/16. Na coluna de Anna Marina