Sífilis vira epidemia
Em seis anos foram notificados quase 230 mil novos casos de sífilis no Brasil.
O Ministério da Saúde admitiu, no final de outubro, que o Brasil enfrenta uma epidemia de sífilis. Entre junho de 2010 e 2016 foram notificados quase 230 mil casos novos da doença, de acordo com boletim epidemiológico do governo.
Três em cada cinco ocorrências (62,1%) estavam no Sudeste e a transmissão de gestantes para bebês é atualmente o principal problema. A situação foi qualificada como “epidemia” somente agora. Em 2015, no país todo, foram notificados 65.878 casos, a maioria deles afetou pessoas na faixa dos 20 aos 39 anos (55%), que se autodeclaram da raça branca (40,1%).
A sífilis ou lues é uma DST (doença sexualmente transmissível). Conhecida como a “grande enganadora” pois apresenta sintomas que podem aparentar outras doenças. Os sinais e sintomas da sífilis variam dependendo da fase em que se apresenta (primária, secundária, latente e terciária). O diagnóstico é feito geralmente por meio de exames de sangue.
Os casos de sífilis congênita, transmitida da mãe para o feto durante a gravidez ou no momento do nascimento, também cresceram muito. No ano passado, a cada mil bebês que nasceram, 6,5 eram portadores de sífilis. O número triplicou em 5 anos.
A doença é causada por uma bactéria chamada Treponema pallidum, que é transmitida através de contato sexual, pelo sangue e na gestação. A primeira manifestação ocorre após 3 a 4 semanas do contágio, em que aparece o candro duro: úlcera geralmente única, com bordas bem delimitadas, sem dor e sem pus.
Nas mulheres e nos homens que fazem sexo com homens esta fase pode passar despercebida pois o cancro pode estar dentro da vagina ou na região perianal. Geralmente a lesão desaparece depois de alguns dias, mesmo sem tratamento, e a pessoa entra numa fase assintomática, em que a bactéria continua se espalhando pela corrente sanguínea e por outros órgãos.
Após seis semanas, se não for tratada, pode virar sífilis secundária: várias lesões avermelhadas espalhadas pela pele, associada a febre, aumento dos gânglios linfáticos, prostração e lesões na cavidade oral. Estas lesões também podem desaparecer mesmo quando não tratadas, e são confundidas com alergias e a pessoa entra numa fase de latência (infectada, mas sem sintomas) e a bactéria atinge outros órgãos (coração, fígado cérebro, olhos e pele) e isso só se manifesta anos mais tarde: sífilis terciária.
Nas décadas de 70 e 80, se alguém pegava sífilis era porque frequentava prostíbulo do baixo meretrício, em uma época que proteção, ou seja, camisinha, não era usada. Só pegava sífilis quem era promíscuo. Hoje, isso mudou, os jovens não estão usando mais a camisinha e a liberalidade aumentou o risco. Não são poucos os jovens que fazem sexo com mais de uma pessoa na noite e muitas vezes não importa o sexo. Soma-se esse comportamento ao não uso da camisinha e chega-se ao resultado da epidemia.
Tenho um amigo de infância. Era o rapaz mais lindo de Belo Horizonte. Não tinha uma moça que não se apaixonasse por ele. E como a maioria dos homens, se aproveitava de sua beleza e charme e nadava de braçada. Não sei tudo o que ele aprontou na vida, mas sei que descobriu, depois de anos, por causa das limitações que começaram a surgir, que estava com sífilis no cérebro. Ainda está vivo, porém com grave comprometimento de locomoção, incapacidade de raciocínio, sem fala e na cadeira de rodas. Não o vejo há anos, mas tive notícias que está irreconhecível.
Após enfrentarmos por décadas a luta pela descoberta da cura da Aids, chegamos a um momento no qual a doença pode ser “controlada” com o uso do coquetel. A Aids não mata mais. Diante desta constatação, parece que os jovens deixaram de ver a doença como terrível, e toda a campanha maciça do governo pelo uso do preservativo caiu no esquecimento. “Já que não vamos mais morrer, não precisamos usar algo tão incômodo”, deve ser o pensamento geral, e aí, aceitam se arriscar com a Aids, mas se esquecem que existem centenas de outras doenças sexualmente transmissíveis que são muito graves. E saem para viver a vida na liberdade, libertinagem e inconsequência.
Conversando sobre isso com uma amiga ouvi um relato. Ela estava com o marido em um resort muito chique na Bahia, passando uma temporada para descansar. Ouviram de um funcionário, em um café da manhã, que estava muito feliz porque a noite tinha sido ótima:ele tinha ficado com 10 pessoas naquela noite. Assustador.
Essa liberação da camisinha trouxe de volta a sífilis com força total, a ponto de virar epidemia, e com esse grande aumento o remédio que trata a sífilis, a penicilina Benzatina, está em falta na rede pública. Na verdade, o mais importante é se prevenir. Façam o teste, se for diagnosticado, lembre-se de informar aos parceiros(as) para que se testem também e sejam tratados adequadamente. E cuide-se, use a camisinha.
Isabela Teixeira da Costa