Meu dia de Forest Gump

Passei uma manhã no banco de uma praça no Rio de Janeiro conversando com quem sentava ao meu lado.

Por uma dessas bobeiras da vida deixei meu visto para os Estados Unidos vencer. Em Belo Horizonte só tem escritório consular, se o visto ainda está com validade, mas em período próximo do vencimento, conseguimos renovar por aqui mesmo, mas, se vencer, baubau. Temos que começar o processo do zero e fazer a entrevista em um dos consulados, no caso do Brasil, no Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Recife ou Porto Alegre.

Não estava com nenhuma viagem programada para o exterior e desliguei completamente do período de vencimento do meu visto, e para a entrevista escolhi o Consulado no Rio de Janeiro, por dois motivos: ser mais próximo de BH, portanto menos tempo de voo e passagens mais baratas; e proximidade com o aeroporto, poderia ir a pé.

Marquei a primeira ida para final de junho. Acordei às 4h e fui para Confins, mas o aeroporto de Santos Dumont estava fechado. Esperei até o último minuto possível, que ainda desse tempo de chegar para a entrevista, mas nada. Voltei pra trás e remarquei para a semana passada.

Tudo certo. Cheguei cedo no Rio e fui direto para o Consulado acompanhada de um rapaz que tinha o mesmo destino. Fiquei surpresa, achei que entraríamos e ficaríamos aguardando em uma sala de espera, e seríamos chamados aos poucos. Ledo engano. A fila inicial é montada no passeio, pelo horário da entrevista.

Uma funcionária do consulado – brasileira, diga-se de passagem –, pergunta de forma nada gentil nosso horário. Como o meu era 11h45, ela respondeu de forma bem grosseira que era para eu dar uma volta pelas redondezas e retornar próximo ao meu horário. Como minha primeira tentativa de ir para o Rio foi frustrada pelo clima, e várias pessoas do voo iam para entrevista, e ninguém compareceu, pensei que outras pessoas também pudessem faltar e que seria possível antecipar meu horário. Questionei sobre isso, e novamente, com a educação que ela não tinha, respondeu: “de jeito nenhum”.

Não me restou outra alternativa se não passear pela Candelária às 8h30 da manhã. Fui tomar um café, assentei e comecei minha manhã de Forest Gump. Dividi mesa com um rapaz e conversamos um pouco. Ele é do Rio, tinha acabado chegar de São Paulo, me contou um pouco de sua história e me sugeriu visitar o Museu de Belas Artes, ao lado do Teatro Municipal. Achei ótima a ideia.

Me dirigi para o museu, mas infelizmente estava fechado. Decidi então sentar em um dos bancos da praça, tomar um pouco de vitamina D enquanto fazia palavras cruzadas, porque o celular tinha ficado no guarda-volumes do aeroporto – não se pode entrar com nenhum aparelho eletrônico no consulado, nem mesmo desligado.

Uma senhora sentou ao meu lado, esperava dar a hora de entrar no trabalho. Mais um bom papo. Ela saiu. Fiquei observando os grupos de turistas e ao mesmo tempo, preocupada com os moradores de rua, um grupo bem grande de homens enormes que estavam por ali, bastante intimidadores. Rapidamente chegou outra senhora, sentou e puxou conversa. Trabalha na Câmara dos Vereadores, que também fica na praça. Mais casos, muitas críticas a todos os políticos e ela se foi. O sol ficou forte e mudei de banco.

De costas senta um rapaz, que fica reparando nas pessoas e solta um comentário em voz alta: “hoje tem muito doido por aqui”, se referindo a dois homens que tinham acabado de passar, separadamente, falando sozinhos, brigando com o nada. Respondi, “é mesmo”. E sem mais nem menos ele fala que está esperando dar a hora de entrar no trabalho, apesar de não ser sua função principal. Está afastado por ser esquizofrênico, mas está medicado. Conversamos muito, ele mesmo não soube dizer por que de contou sobre sua doença, mas ficou feliz de não encontrar em mim nenhum tipo de preconceito. Disse que não consegue trabalhar mais de quatro horas, porque é muito agitado e ansioso. Mas achei curioso uma pessoa com problemas psiquiátricos criticar “coleguinhas”.

Nesse vai e vem de gente, de conversas e casos, deu 11h e retornei para o consulado. Outra funcionária, dessa vez muito educada, pediu meu passaporte e autorizou minha entrada. Rapidamente fui chamada e em menos de dez minutos estava liberada com meu visto autorizado. Mais uma vez percebi que muitas vezes a arte é que imita a vida.

Isabela Teixeira da Costa