Momentos que ficam guardados para sempre

É sempre bom quando nos surpreendemos positivamente em uma viagem.

Bryant Park

Quando eu tinha 12 anos e minha irmã 15, nossos pais nos deram de presente uma viagem à Disney. Disneylandia, porque ainda não existia a Disney World. Isso mesmo, sou das antigas. Por outro lado, tivemos uma grande vantagem, porque conhecemos a Califórnia, um lindo estado dos EUA.

Naquela época, quando se mandava duas filhas para o exterior tinha que ser com alguém que você confiava muito e foi aí que nossa viagem entrou na lista dos pós e dos contras com força total. A excursão escolhida foi de uma senhora que levava um grupo de velhos. Adolescentes só mesmo duas filhas de uma outra passageiras – que na época todos se referiam a ela como “a desquitada” –, uma outra moça da minha idade, minha irmã e eu.

Por outro lado, nada de ir apenas à Disneyland e voltar. Fomos a Los Angeles, San Francisco, Las Vegas, Nova York e Miami. No quesito parques, fomos em Hollywood, Universal, Magic Mountains, Knots Barry Farm.  Em Las Vegas, driblamos os seguranças e passamos a noite jogando nos caça niqueis, que na época era de alavanca. Os braços ficaram tremendo tanto no dia seguinte que não conseguimos assinar travels cheques.

Fui a Nova York, mas não lembrava de nada, só mesmo da seção de Barbie da Macy’s, da Berta Brasil – loja de brasileiros onde comprávamos de um tudo –, e do lobby do Hilton, que era todo de veludo vermelho, onde ficamos hospedadas.

Meu sonho era retornar à Big Apple. Infelizmente a oportunidade nunca surgia. Retornei aos Estados Unidos para fazer intercambio em 1979, fui à Florida diversas vezes depois para conhecer a Disney World, fiz curso de diagramação em Saint Petesburg, em Tampa, fiz estágio no Miami Harold. Levei minha filha à Disney para celebrar seus 11 anos de vida, mas nada de ir à Nova York.

Na Universal

Este ano, Luisa me chama para retornar à Disney em seu aniversário e depois dar uma esticada em Nova York. Ela foi em novembro do ano passado com um grupo de amigas e se apaixonou pela cidade. Claro que topei na hora.

Não precisamos dizer nada sobre Orlando. Luisa e eu sempre voltamos a ser crianças nos parques. É delicioso. Claro que mudamos um pouco o tipo de brinquedo que vamos. Rodamos a cidade, saímos para jantar. Encontramos com um casal de primos que moram por lá. Foram momentos deliciosos de mãe e filha que ficarão guardados para sempre na minha memória e no meu coração.

Seguimos para Nova York. O que é aquilo??? Ficamos na casa de uma grande amiga, da minha época de adolescência. La mora em Forrest Hills, um bairro mais do que charmoso no Queens. Rodamos Manhattan a pé. É tudo lindo. Aqueles prédios enormes, hipermodernos, e entre eles as antigas edificações, muito charmosas.

O clima da cidade é algo inexplicável. O Central Park é delicioso, andar pelas ruas, ver a diversidade das pessoas, atravessar a Ponte do Brooklin, Time Square à noite, enfim, é tudo lindo e delicioso. E a civilidade encanta, o respeito ao próximo. Todos pedem licença, desculpa, dão bom dia, perguntam como você está.

Com as amigas Aurinha e Dâmaris

Mas tenho certeza que tudo ficou mais lindo do que é porque estava rodeada por pessoas especiais que eu amo e que me amam como a minha filha, a Áurea e seu marido Paulo Marciano, que nos recebeu como rainhas e Dâmaris Doro Lorenzoni, que quando soube que iriamos para lá, não quis perder a oportunidade de viajar conosco.

Quando retornei – completamente apaixonada por NYC –, contando sobre a viagem para um amigo, ele relatou um fato que ilustra muito bem como são as coisas por lá. Ele estava de viagem com um sobrinho, fazendo compras para suas lojas aqui no Brasil. Por uma dessas infelicidades, o rapaz esbarrou no carro da frente. Foi muito de leve, nem marcou o para choque de nenhum dos carros. Ele se dirigiu ao motorista, pediu desculpas, e disse que não havia estragado nada. O senhor respondeu que não era bem assim. Chamou a polícia que informou que por um ano, se o senhor tivesse algum problema no pescoço por causa do impacto, ele seria responsável por isso.

Quanta diferença, não é mesmo. Aqui as pessoas, trombam e fogem, atropelam, matam e não prestam socorro e fica tudo por isso mesmo. Temos muito o que melhorar, e começa pelo ato que vamos praticar neste domingo. Vamos votar com consciência para mudar nossa realidade.

Isabela Teixeira da Costa

Minha tia Yayá e a santa

Tia Yayá
Tia Yayá

Tia Yayá era muito engraçada, e seus casos são inesquecíveis. Este merece registro.

Já falei aqui do grupo que temos no WhatsApp das primas da família Teixeira da Costa Almeida. São cerca de 60 primas que ficam conversando o dia inteiro. Não é sempre que posso participar em função do trabalho, mas dou uma passada de olho com frequência. Muita coisa que já publiquei aqui saiu de lá.

Semana passada, em função de vários casos de família que são contados ali, decidiu-se criar outro grupo chamado ‘Causos de Família’, incluir uns primos e registrar estes casos. A intenção é escrever um livro. Fiquei responsável por esta tarefa. Não sei se vou escrever o livro, mas já estou coletando e organizando as histórias que a turma está postando.

Não resisti e vou contar um dos casos. Tinha uma tia muito querida, carinhosamente chamada por todos de Yayá. Dizem que era linda quando moça, chegou a ser miss e era muito vaidosa. Penso que entre a vaidade e o prazer de comer, o segundo ganhou disparado e ela foi ganhando peso. Ficou obesa mórbida. Ela morava na Rua Goitacazes, e nas férias convidava minha irmã e eu para passar o dia lá, brincando com nossa prima Olguinha, que vinha de Brasília.

Olguinha com Tia Yayá
Olguinha com Tia Yayá

Tia Yayá era vizinha de um padre. Ela morava no apartamento de cima e o bendito padre cismou que minha tia chupava laranja e jogava o bagaço na sua varanda. Brigaram por causa disso. Tia estava incomodada com a briga, afinal, brigar com padre não era bom presságio. Diz a cultura popular que quem briga com padre a vida não vai pra frente.

Era época de visitação da santa, quando a imagem passa o dia na casa de alguém da paróquia para abençoar a família. Tia Yayá quis receber a santa para estreitar os laços com o padre, porém, para fazer as pazes decidiu fazer uma celebração em homenagem à imagem de Nossa Senhora em sua casa, e convidou o vizinho padre para os atos litúrgicos. Não bastava receber a imagem e rezar com a família tinha que ter pompa e circunstância. Ele não queria aceitar de jeito nenhum, com muito custo concordou. A família encheu a casa: Simão, seu filho; as netas Marina, Patrícia e Olguinha ainda crianças; a vizinha Chiquita, que era contra-parente. Tudo enfeitado, lindo, altar caprichado.

O padre entrou jogando água benta com uma expressão de alegria. Percebia-se claramente que as pazes tinham sido feitas. Tia Yayá, em sinal de respeito à santa e ao momento litúrgico tão importante, resolveu se ajoelhar, apesar de toda dificuldade em função do seu peso. Apoiou-se em uma poltrona para ajudar no movimento, a poltrona quebrou, ela caiu no chão, o pé da poltrona zuniu no ar, bateu na imagem e decepou a cabeça da santa. Pandemônio formado!
Todos da família tiveram que sair da sala porque estavam explodindo de rir, e o padre furioso, com a imagem de sua santa decepada e tia Yayá estatelada no chão sem ninguém para ajudar a levantá-la.

Foi uma tragédia.
Passado o primeiro momento e depois de se recomporem, voltaram para a sala para ajudar minha tia a se levantar. Ela, ainda no chão agradecendo a todos que tentavam ajuda-la, mas no fundo não se esforçando muito para sair daquela posição. Dizia adorar ficar no chão, era fresco e fazia bem para a coluna. Só quem estava lá sabe o problema que foi tirá-la do chão.
Passado o período para esquecer o vexame, minha tia foi tomar banho e encontrou um caroço no braço. Trágica como ela só, logo pensou em câncer e castigo pelo incidente com padre e santa. Imediatamente fez uma promessa a São José de quem era devota: Nunca mais ia falar mal do padre nem implicar com ele se não fosse nada. Daí em diante só tomava banho com uma esponja grossa e nunca mais sentiu caroço nenhum. Ninguém sabe dizer se a amizade foi selada, ou se pelo menos ela parou de falar mal do padre.

Essas lembranças famíliares são uma delícia, dão um tempero especial à vida.

Isabela Teixeira da Costa

Lembranças

Guanabara
Guanabara

Tempo passa, as coisas mudam, mas as lembranças continuam.

Vivemos de memórias. Não podemos viver do passado, mas o que seria de nós se não tivéssemos lembranças? Fico imaginando como seria uma pessoa sem lembranças, sem memória. Deve ser terrível. Em várias reportagens de catástrofes, quando as pessoas perdem suas casas em terremotos, tsunamis, incêndios, etc, os objetos que mais sentem trem perdido são as fotografias. Por que? Porque elas são lembranças do que as pessoas viveram.

Família: Regina, Ângela, Renato, eu, Camilinho e Beth
Família: Regina, Ângela, Renato, eu, Camilinho e Beth

O que vivemos forma o que somos hoje, as lembranças são a nossa história. Algumas são doces, outras mais amargas e umas podem ser até indiferentes, mas são nossas, nos pertencem. É impressionante ver como cada momento vivido fica guardado de maneira diferente em cada pessoa.

Ontem, minha irmã e eu fomos ao centro da cidade procurar uma loja. Acabamos andando um trecho da Avenida Afonso Pena a pé. Moramos muitos anos no centro, até os meus 14 anos de idade. Andava a pé tranquilamente, naquela época isso era possível. Ontem, enquanto andávamos vimos como a Igreja São José ficou linda depois da restauração. Está no estilo marroquino ou russo, sei lá, só sei que ficou linda.

Íamos andando e lembrando das lojas Guanabara, Inglesa Levy, Bemoreira Ducal, Sloper. Eram lojas ótimas que íamos sozinhas na maior tranquilidade. A Kopenhagen que ficava na esquina de Tamoios e Afonso Pena. Saudade. Enquanto conversávamos sentia o cheiro de urina, que nem a chuva que tinha caído foi suficiente para limpar. Olhava em volta e via o cenário que nem de longe lembra o antigo. Nesta época a Avenida já estria toda enfeitada com motivos natalinos, hoje, nem sombra de luzinha, nem mesmo nas lojas.

Sloper
Sloper

Morava na Rua Tupis em frente do Shopping Cidade, na época era o Cine Jacques. E ali no centro tinha também o Cine Guarani, onde hoje é o Museu Inimá de Paula, o Cine Tamoio e o Metrópole, onde hoje é o Bradesco. Nas férias eu nadava de braçada. Como não era perigoso ir sozinha no cinema, entrava na seção das 14h e saía às 18h. Tinha uns 11 anos. O único problema eram os tarados, então tínhamos que assentar na cadeira da beirada, no corredor do meio. Se algum homem assentasse do lado, era só mudar de lugar. A gente sempre usava um broche, qualquer coisa fincava a mão do tarado. Quando íamos em turma, lanchávamos depois no Saci.

Lembro quando passou E o vento levou. Foi no Cine Pathé, na Savassi. Eu tinha 13 anos e as primas todas resolveram ir. Ângela Rocha, minha prima não quis me deixar para trás, mas eu não tinha idade. Ela soltou meu cabelo, me maquiou e lá fomos nós. Entrei, 4h de filme. Dormi mais da metade, mas estava me achando porque entrei em um filme de censura 16 anos.

Tia Neury morava no Edifício Niemeyer. Não esqueço uma vez que estávamos todos lá, já era bem tarde. Eu estava brincando com as Barbies da Beth – eram lindas, tinha trazido da Europa, aqui não existia –, aí me chamaram na sala e quando cheguei tinha uma vela sobre uma latinha de extrato de tomate e toda a família cantava parabéns para mim (no dia seguinte era meu aniversário). Foi a primeira surpresa que fizeram para mim. Fiquei tão emocionada. Eu era uma pré-adolescente. Chorei muito. Até hoje lembro a emoção que senti: a pessoa mais amada e importante do mundo.

Lembranças, memórias. Como é bom.

Isabela Teixeira da Costa

Lembranças da minha escola

ihO que vivemos no colégio não esquecemos nunca.

No domingo fui almoçar com uma amiga e tive o prazer de reencontrar com uma pessoa muito querida, que de certa forma fez parte da minha vida por muitos anos: professor Ulisses de Oliveira Panisset. Foi reitor do Colégio Metodista Izabela Hendrix, hoje, Instituto e Centro Universitário.

Ele é um querido de todos os alunos, professores e funcionários que passaram por lá durante sua gestão. Entrei no Izabela criança. Fiz o maternal no Instituo Brasil, mas no jardim de infância fui para lá e não saí mais. Fui aluna de inúmeras professoras e professores que guardo no coração até hoje.

Não esqueço do saudoso professor Vinagre, de matemática, gostava muito de mim. Até hoje não entendo o porquê. Nos dias de calor me colocava assentada na frente da porta para que eu ficasse na corrente de ar. Quando a aula era no horário que antecedia o recreio sempre me dava um dinheiro e pedia que eu buscasse para ele um salgado e um refrigerante na cantina, e completava: “E um para você também”. Não adiantava dizer que não queria e não precisava, a resposta era sempre a mesma: “é ordem de professor e não se discute”. Até hoje sinto não ter ficado sabendo quando faleceu, pois não pude prestar minha última homenagem.

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Professor Panisset Foto Estado de Minas

Voltando ao Prof. Panisset, já tinha encontrado com ele outras vezes neste restaurante, porém sempre estava acompanhando, então só nos cumprimentávamos. Desta vez estava sozinho e depois assentou em nossa mesa e batemos um longo papo. No alto de seus 91 anos, relembramos bons momentos do colégio.

A primeira coisa que disse foi: “A sua família inteira estudou no Izabela, e foi a única até hoje a fazer isso”, afirmou orgulhoso. Meus dois irmãos, Camilo Filho e Renato fizeram o primário lá, depois mudaram para o Santo Antônio. Regina e eu entramos no jardim e seguimos. Regina, mais tarde foi para o Pitágoras. Assim que abriram a faculdade de Letras minha mãe se matriculou e meu pai, não sei se por ciúmes  – professor Panisset garante que sim -, ou por companheirismo se matriculou também. Mas depois, meu pai tomou bomba por freqüência, e desistiu. Ele saía muito tarde do jornal onde já era diretor Executivo, e sempre perdia a primeira aula.

Continuamos os casos. A sala dele tinha uma mesa de centro linda com um aquário. Lembramos de certa vez, que minha prima – que também estudava lá – foi expulsa da sala de aula e mandada para a sala dele. Ele precisou sair por um minutinho e pediu que ela ficasse esperando. Quando retornou, ela não estava mais lá, e os peixinhos estavam sobre a mesa, mortos. Foi a gota d’água e ela foi convidada e se retirar da escola.

Professor Panisset nos contou que tinha uma aluna estrangeira, filha de um grande executivo que estava trabalhando no Brasil. Ela era simpática, comunicativa, querida por todos os professores e colegas. Certo dia, a cantina aumentou o preço do cachorro quente e a menina ficou transtornada. Tomou uma atitude de revolta que surpreendeu a todos. Na época, a cantina ficava debaixo do teatro, então ela subiu as escadas de acesso à entrada lateral do teatro, dependurou uma corda formando uma forca e anunciou que quem entrasse na cantina seria enforcado. A coisa ficou preta, porque ela estava bravíssima e falava sério.

Chamaram correndo o professor Panisset. Quando ele chegou ela se sentiu intimidada, ficou mais mansa e acabou atendendo seu chamado, acompanhando-o até sua sala. Ele pediu que chamassem o pai da garota que era alemão. Em meia hora ele chegou, ouviu o relato e foi logo tirando o cinto para dar uma surra na filha. Foi impedido por Panisset, que retirou a garota de sua sala e teve uma conversa com o homem, explicando que a menina deveria estar com algum problema, pois a reação que ela teve não condizia com seu comportamento habitual. O empresário tirou a menina do colégio. Graças a Deus ouviu os conselhos do nosso reitor. Um ano depois, a moça retornou ao Izabela e contou sua história.

Estava com um tumor no cérebro, que tinha provocado tal mudança de temperamento. Foi operada na Suiça, onde continuou dando prosseguimento aos seus estudos. Uma vida foi salva graças à percepção do Panisset por sua grande experiência.

Até hoje, tenho amigos que fiz no Izabela. Depois conto mais. Tempo bom, que não volta mais.

Isabela Teixeira da Costa