Minas de luto

Dá pra evitar dramas como o de Brumadinho. Basta querer.

Na sexta-feira, fomos surpreendidos, na hora do almoço, pela notícia do rompimento de mais uma barragem da Vale, desta vez em Brumadinho. O dia amanheceu bonito, céu azul, sol brilhando, calor. Tinha tudo para ser mais um fim de semana de verão alegre de descanso. No entanto, vivemos uma tragédia, e pior de tudo, uma tragédia anunciada.

Invade-nos um sentimento estranho, esquisito, abafado. É um misto de tristeza, raiva, revolta, incredulidade e impotência, mesmo não conhecendo ninguém que estava ali. Mas quando recebemos a informação de que alguém que conhecemos mora na região e não está atendendo o telefone, o sentimento muda, acrescentando a ele o desespero da aflição e preocupação, porque o acidente fica mais próximo.

O porteiro do prédio mora em Mário Campos, a 50 metros do Rio Paraopeba. Demorou a atender o celular e dar notícias. Graças a Deus, está tudo bem. Ele e a família foram retirados de casa, por precaução. Segundo ele, a Defesa Civil chegou à cidade com mais de 10 caminhões, recolhendo a mudança de todos. Guardou tudo em uma escola e levou as pessoas para uma igreja. A lama represou o rio, que ficou só com um palmo de água. Peixes podiam ser pegos com as mãos.

O temor agora é por quanto tempo a água do rio, represada por essa lama, vai resistir. Ou ele vai empurrar a lama toda e inundar a região?. Uma coisa me intrigou. O sensor de risco da barragem fazia a leitura a cada 15 dias. Por que não fazer leituras semanais ou até mesmo diárias? Depois do acidente, passou a fazer leituras a cada seis horas. Por que não fazê-las constantemente? No domingo, outra ameaça: o rompimento da barragem de água. De tarde, o rumo da conversa mudou. Disseram que esse risco havia diminuído.

Tivemos três anos para tornar as leis mais rigorosas, fiscalizar mineradoras, adotar medidas e exigir ações para evitar novas catástrofes. No entanto, o antigo governo flexibilizou. Dá para entender. Infelizmente, sim. A ganância ultrapassa qualquer limite, e as pessoas que deveriam olhar por nós só olham para elas mesmas.

Na manhã de ontem, o saldo era de 60 mortos, 292 desaparecidos, 192 resgatados e 135 desabrigados, segundo a Defesa Civil. Infelizmente, acredito que esse acidente terá outro andamento porque os atingidos não foram pessoas pobres e simples de um vilarejo, mas empresários, como o ex-dono da escola de inglês Number One e sua família, hóspedes da pousada mais luxuosa da região, que tinha o costume de receber pessoas famosas, e os próprios funcionários da Vale. Isso alenta? Não. Piora ainda mais saber que neste mundo, em meio a catástrofes, temos dois pesos e duas medidas.

Já estão falando dos riscos que pairam sobre Congonhas. A cidade histórica, cheia de belas peças de Aleijadinho, tem expressiva população e sofre as consequências da ação das mineradoras. Minas Gerais vive entre a cruz e a caldeirinha. Se de um lado mineradoras sustentam todos esses municípios, por outro, são elas as responsáveis por nossa destruição. O que vale mais? É possível encontrar o equilíbrio? Ainda dá tempo para remediar o irremediável?.

O que podemos fazer? Orar e pedir a Deus que não permita o rompimento de outra barragem. Ouvir o presidente da Vale pedir desculpas, dizer que esta catástrofe foi terrível – tragédia muito mais humana do que ecológica? Até hoje há famílias de Bento Gonçalves sem receber indenização. O vilarejo não foi reconstruído. Nada andou. E não foi por esquecimento, pois, a cada ano, a imprensa relembra com excelentes matérias a maior catástrofe ecológica do mundo.

É possível, sim, tomar medidas que mudem essa triste realidade. Basta querer.

Isabela Teixeira da Costa